A Casa do Dragão, Dolo Eventual e Culpa Consciente

A Casa do Dragão, Dolo Eventual e Culpa Consciente

A Casa do Dragão (House of The Dragon), série spin-off de Game of Thrones da HBO, baseado no livro Fogo & Sangue de George R. R. Martin, conta a história da guerra civil ocorrida dentro da Casa Real Targaryen para decidir quem seria o rei do trono de ferro. Esse evento ficou conhecido como a Dança dos Dragões. Dentro do ordenamento jurídico brasileiro existe o Dolo Eventual e a Culpa Consciente. Vamos usar a série para conceituá-los e diferenciá-los.

A Casa do Dragão, Dolo Eventual e Culpa Consciente

O Dolo pelo dicionário significa má-fé, maquinação e fraude, sendo a vontade dirigida na obtenção de um resultado criminoso ou risco de produzi-lo. Dentro do ordenamento jurídico brasileiro, ocorre quando alguém tem intenção de cometer determinado ato ou induzir alguém a cometê-lo. Consiste na deliberação de infringir a lei, seja de forma ativa ou omissa, com plena noção do que se está fazendo.

O crime de furto é um exemplo de infração penal na qual apenas se dá por meio de dolo, ou seja, com intenção de cometê-lo. Não existe furto culposo. Se não existe intenção específica de furtar, não existe crime.

Por outro lado, a Culpa, dentro do Direito Penal, ocorre quando não existe a intenção, mas em razão de conduta ativa (comissiva) ou omissiva, o indivíduo acaba cometendo a infração penal, principalmente em razão de imprudência (ausência de cuidado que ocasiona o crime ou contravenção penal), negligência (sabendo dos riscos, não toma as devidas precauções) ou imperícia (falta do domínio da técnica ocasiona a infração penal). Por ser exceção, a possibilidade de culpa deve estar expressa no artigo que tipifica o crime.

O Código Penal Militar, em seu art. 33, inciso II, trouxe um conceito de culpa mais completo do que o do Código Penal, na qual estabelece que “culposo, quando o agente, deixando de empregar a cautela, atenção, ou diligência ordinária, ou especial, a que estava obrigado em face das circunstâncias, não prevê o resultado que podia prever ou, prevendo-o, supõe levianamente que não se realizaria ou que poderia evitá-lo

No momento de avaliar a culpa, será considerada a previsibilidade do resultado da conduta, ou seja, o indivíduo, com base em conhecimento médio de qualquer pessoa, deveria prever o resultado causado por sua conduta. 

Exemplificamos a colisão entre carros, por um breve momento de desatenção dos motoristas. Ambos faltaram com o dever de cuidado ao dirigir. Outro exemplo é de indivíduo que dirige em alta velocidade e provoca acidente vitimando outras pessoas. O motorista deveria prever os riscos de dirigir em alta velocidade. Quando ocorre o crime, esse se dará pela modalidade culposa.

 ⚠️ALERTA DE SPOILER

A Casa do Dragão, Dolo Eventual e Culpa Consciente

No último episódio da primeira temporada, Aemond Targaryen, montado em Vhagar, o maior dragão vivo da série (aproximadamente 150 metros de comprimento), na tentativa de dar um susto em seu sobrinho, Lucerys Velaryon (montado num dragão muito menor), acaba o matando, dando início a Dança dos Dragões (guerra civil).

A Casa do Dragão, Dolo Eventual e Culpa Consciente

De acordo com Rogério Sanches Cunha (2012, p. 49), no Dolo Eventual, o sujeito prevê as possíveis consequências de seus atos, mas sua intenção se dirige na intenção da realização de apenas um, aceitando, contudo, que possam ocorrer outros. Exemplo do sujeito que busca a lesão corporal, mas acaba matando o indivíduo (CUNHA, 2012).

Nucci (2020, p. 360) leciona que o Dolo Eventual é a vontade do agente dirigida a um resultado, prevendo a possibilidade de um segundo resultado não desejado, mas admitido. O agente assume o risco de produzir um efeito colateral de sua conduta (NUCCI, 2020). Ele exemplifica narrando o caso em que um sujeito resolve proferir disparos com arma de fogo a um muro (resultado que se quer atingir é disparar contra o muro), prevendo, no entanto, a possibilidade dos tiros atravessarem o muro e atingirem alguém (NUCCI, 2020). O agente despreza a possibilidade do segundo resultado (ferimento ou morte de terceiros atingidos). Caso atinja algum terceiro, responderá por homicídio doloso, por meio de dolo eventual (NUCCI, 2020).

Atualmente as decisões de tribunais (jurisprudências) têm sido revistas em casos de graves crimes de trânsito, para não mais condenar o agente em culpa consciente e sim em dolo eventual (NUCCI, 2020). Isso seria devido às inúmeras campanhas de conscientização realizadas acerca de direção perigosa, direção mediante embriaguez, que seriam suficientes para esclarecer os motoristas acerca da vedação legal de determinadas condutas (NUCCI, 2020). 

Se mesmo assim, o condutor do veículo agir dessa forma nitidamente arriscada, estará demonstrando seu desapego à incolumidade alheia, podendo responder por delito doloso (NUCCI, 2020). Exemplifica-se o caso de indivíduo que se envolve em corrida de rua e acaba atropelando pedestre, fica evidenciado o Dolo Eventual inerente ao comportamento (NUCCI, 2020).

Ainda segundo Rogério Sanches Cunha (2012), a Culpa Consciente ocorre quando o agente prevê os possíveis resultados, mas espera que estes não ocorram, supondo poder evitá-los por meio de sorte ou com base em sua habilidade. De acordo com Nucci (2020), na Culpa Consciente, o agente tem não somente a previsibilidade do resultado, mas a efetiva previsão do resultado, esperando sinceramente que não aconteça. Exemplificamos o caso de direção em velocidade elevada para cumprir compromisso a tempo, prevendo que em velocidade alta pode ocorrer algum acidente, mas espera sinceramente que não ocorra, em virtude de sorte ou de sua habilidade na direção (NUCCI, 2020).

A diferença preponderante aqui entre o Dolo Eventual e a Culpa Consciente consiste no fato de que no primeiro, o agente sabe que um segundo resultado pode ocorrer em razão de sua conduta, mas este não se importa. Já no segundo, o agente espera sinceramente que o segundo resultado não ocorra.

Vejamos o que Nucci (2020) discorre acerca dos dois:

Trata-se de distinção teoricamente plausível, embora, na prática, seja muito complexa e difícil. Em ambas as situações o agente tem a previsão do resultado que sua conduta pode causar, embora na culpa consciente não o admita como possível e, no dolo eventual, admita a possibilidade de se concretizar, sendo-lhe indiferente (NUCCI, 2020, p. 318).

Voltando para a série A Casa do Dragão, analisando o elemento subjetivo da cena final da temporada, Aemond tinha a clara intenção de lesionar seu sobrinho, pelo menos retirando seu olho, e ao atacá-lo com o maior dragão de toda série, assumiu o risco de eventualmente matá-lo. O que no final, se concretizou.

Por outro lado, Aemond não esperava receber uma resposta e ser atacado por Lucerys. Aemond sabe que dragões desobedecerem é algo comum e não esperava que ocorresse. Pode se argumentar que ele não esperava de forma alguma que poderia resultar em morte. Sua reação de arrependimento e desespero ao ver o dragão matar seu sobrinho, pode ser um indício de Culpa Consciente. Como Nucci explicou, caracterizá-los na prática é bem mais complexo do que parece. O elemento subjetivo é muito difícil de definir.

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